terça-feira, 23 de março de 2010

Influenza A(H1N1): ‘Influenza’ dos laboratórios


vacinaQuatorze membros da Assembleia Parlamentar europeia asseguram que as companhias farmacêuticas influíram sobre os responsáveis da saúde pública para promover suas vacinas. Um especialista da OMS admitiu que seu instituto é financiado por um laboratório.
A reportagem é de Pedro Lipcovich. A tradução é de Vanessa Alves.

“Para promover suas vacinas contra a gripe A (H1N1), as empresas farmacêuticas influíram sobre os responsáveis da saúde pública a fim de alarmar os governos no mundo inteiro”, afirmam quatorze membros da Assembleia Parlamentar europeia liderados por Wolfgang Wodarg, presidente da Comissão de Saúde do Conselho da Europa, e exigem que o Conselho “efetue uma imediata investigação” a respeito. Afirmam que “a definição de uma pandemia alarmante não deve estar sob a influência dos vendedores de drogas”. Um integrante do Grupo de Especialistas em Imunização que assessora à OMS reconheceu que o principal sustento econômico de seu próprio instituto científico é um fabricante de vacinas contra a gripe. No entanto, um representante oficial da OMS respondeu que a entidade internacional “tem mecanismos de proteção contra conflitos de interesses” e observou que “muitas mortes pela gripe A (H1N1) foram evitadas graças às advertências da OMS”.
A Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (APCE) trataria o tema na sua sessão que começa dia 25 deste mês. Sua Comissão de Saúde convidou para essa mesma semana a OMS e os laboratórios farmacêuticos envolvidos, segundo afirmou o presidente do organismo, o epidemiologista alemão Wolfgang Wodarg. Segundo a moção apresentada pelos quatorze parlamentares de diferentes setores, “com o propósito de promover suas drogas e vacinas patenteadas contra a gripe, as companhias farmacêuticas influenciaram cientistas e agências oficiais, responsáveis pela saúde pública, para alarmar os governos no mundo inteiro. Desperdiçaram valiosos recursos em ineficientes estratégias de vacinação, e expuseram inutilmente a milhões de pessoas sãs ao risco dos efeitos colaterais desconhecidos de vacinas insuficientemente testadas”.
“As campanhas contra a gripe aviária (2005/6) e contra a gripe A (H1N1) parecem ter acabado também com a credibilidade e confiabilidade de importantes agências internacionais de saúde. A definição de uma pandemia não deve estar sob a influência dos vendedores de drogas.” Por isso, “os estados-membros do Conselho da Europa deveriam requerer imediatas investigações”. O Conselho abrange 47 países, inclusive a Rússia e a Turquia.
Em uma extensa entrevista concedida ao jornal francês L’Humanité, Wodarg assegurou que a declaração de pandemia “não se justificava”. Só foi possível porque, em maio do ano passado, a OMS mudou sua definição do que constitui uma pandemia: antes, não só requeria que a doença espalhasse em muitos países ao mesmo tempo, mas tivesse consequências muito graves quanto a quantidade de casos mortais; na nova definição, suprimiu-se este critério e só se considerou o ritmo de difusão da doença”.
“Outra coisa que suscitou minhas suspeitas –acrescentou Wodarg– foi a recomendação da OMS de dar duas doses de vacina: não tinha nenhuma justificação científica. Também não se justificava sua recomendação de utilizar vacinas patenteadas: era perfeitamente factível, como cada ano, completar as vacinas da gripe estacional com as partículas antivirais específicas para o novo vírus.”
Segundo Wodarg, estas novas vacinas implicam “um risco, já que, na pressa, em alguns casos, utilizaram coadjuvantes insuficientemente testados”, referindo-se especificamente à “ vacina elaborada pela Novartis”, produzida mediante “uma técnica que jamais havia sido utilizada até o momento”.
Wodarg também denunciou que “Klaus Stöhr, que era o chefe do Departamento de Epidemiologia da OMS na época da gripe aviária, e que preparou então os planos destinados a enfrentar uma eventual pandemia, logo passou a ser um importante funcionário da empresa Novartis. Vínculos similares existem entre marcas como Glaxo ou Baxter e membros influentes da OMS”.
Ao mesmo tempo, soube-se de um vínculo entre o cientista finlandês Juhani Eskola, membro do Grupo Assessor Estratégico de Especialistas em Imunização (SAGE) da OMS –organismo que assessora aos Estados-membros sobre quais vacinas utilizar e que quantidade comprar– e a marca GlaxoSmithKline (GSK), fabricante de uma vacina contra o vírus H1N1. Em 2009, esta empresa se constituiu na primeira fonte de ingressos do Programa de Pesquisa em Vacinas da Finlândia, dirigido por Eskola, ao qual outorgou nove milhões de dólares. A revelação foi efetuada na Dinamarca pelo jornal Information. Não obstante, Eskola continuará integrando o SAGE, cujo secretário-executivo, Philippe Duclos, argumentou que “o contrato da GSK com a instituição dirigida por Eskola não se refere à vacina contra o vírus H1N1”.
Keiji Fukuda, assessor especial da OMS sobre a pandemia da gripe, respondeu que “a OMS tem mecanismos de proteção que funcionam contra conflitos de interesses, em geral e com relação a esta pandemia em particular”. Lembrou que a doença causou pelo menos 13.000 vidas e reiterou que a gripe A (H1N1) “é uma pandemia: a OMS jamais mudou sua definição básica de pandemia, que é: a disseminação de uma doença pelo mundo inteiro”. Acrescentou que “uma razão para que a pandemia não tenha sido mais grave foi a resposta sem precedentes dos países do mundo, alertados pelas advertências da OMS. Não sabemos quantas doenças e mortes foram impedidas graças a estas ações”.
Compras desmesuradas
A Grã-Bretanha e a Alemanha, como já o tinham feito a Espanha e a França, decidiram cancelar ordens de compra de vacinas contra a gripe A (H1N1). O Departamento de Saúde britânico anunciou que renegociará seus contratos com Baxter International e com Glaxo-Smith-Kline e a Alemanha se propõe a cancelar a metade dos 50 milhões de doses que tinha ordenado a Glaxo-Smith-Kline.
Na segunda-feira passada, a ministra da Saúde francesa anunciou o cancelamento de 50 milhões dos 94 milhões de doses que esse país tinha encarregado a Sanofi-Aventis, Glaxo-Smith-Kline, Novartis e Baxter. Em dezembro, a Espanha tinha anunciado que se propunha a devolver doses sem usar a vacina. A Holanda e a Suíça planejam enviar o excesso de vacinas aos países nos quais ainda há carência.
Uma das razões é que “todos os programas de vacinação se organizaram sobre a base de fornecer duas doses, mas resultou que só é necessário uma para conseguir a imunização”, conforme explicou o Centro Europeu para o Controle e Prevenção de Doenças.
(Ecodebate, 18/01/2010) publicado pelo IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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